23/07/2025 Geral

INDÚSTRIAS DA SERRA AVALIAM MEDIDAS PARA MITIGAR OS IMPACTOS DO TARIFAÇO

O segmento madeireiro gaúcho é um dos que mais devem sofrer impactos com as tarifas de 50% anunciadas pelo presidente norte-americano Donald Trump, com vigência a partir de 1º de agosto.

22 de Julho de 2025 - Publicado às 14:15

O segmento madeireiro gaúcho é um dos que mais devem sofrer impactos com as tarifas de 50% anunciadas pelo presidente norte-americano Donald Trump, com vigência a partir de 1º de agosto. No ano passado, a atividade embarcou em torno de US$ 100 milhões aos Estados Unidos, equivalente a 30% do total vendido ao exterior.

“O anúncio nos preocupa muito, pois temos grande dependência do mercado americano, que é o maior produtor de madeiras coníferas, mas também o maior consumidor”, afirma o presidente do Sindimadeira-RS, Leonardo De Zorzi. O principal produto exportado tem uso em áreas residenciais externas, especialmente cercas de madeira.

A entidade tem participado de reuniões setoriais e amplas na Fiergs e CNI no sentido de articular medidas junto ao governo federal. De Zorzi cita como pleito a prorrogação do prazo estabelecido pelo governo americano, considerado curto, que asseguraria mais tranquilidade aos setores para adoção de medidas que mitiguem ou amenizem os impactos.

Também demanda a manutenção da alíquota em 10%, a preservação do bom ambiente da negociação e da diplomacia e adoção de medidas emergenciais, como adotadas na pandemia da Covid-19, com linhas especiais de financiamentos, uso do Reintegra, redução de jornada e salários com compensação pelo governo, e suspensão temporária de contratos e de recolhimento do INSS e do FGTS. “São medidas necessárias para fortalecer o caixa das empresas neste momento. Algumas indústrias, no entanto, poderão ter de aplicar paradas temporárias”, adianta.

O dirigente aponta a gravidade da situação na ausência de clareza nas informações disponíveis. Relata que não há uma ordem executiva citando os detalhes, diferentemente da anunciada em abril. 

“Temos associados com mercadorias em viagem no oceano e não sabem o que vai acontecer quando chegarem. Em teoria, deve ocorrer a taxação automática de 50% sobre o valor da nota fiscal. Quem tomar posse será obrigado a recolher o valor junto a aduana americana. Como isto abre um precedente grande, a extensão do prazo é importante até para resolver esta questão”, argumenta.

Outros compradores determinaram que cargas programadas não sejam embarcadas. “A suspensão de embarques e de pedidos está ocorrendo. Da mesma forma, cancelamentos de pedidos, o que é muito mais sério”, lamenta.

Já a indústria moveleira tem uma situação menos crítica, porém igualmente preocupante. O presidente da Movergs, Euclides Longhi, frisa que os Estados Unidos é o principal comprador, com participação de 16% no total das exportações do setor.

Em 2024, os negócios somaram US$ 261 milhões e, neste ano, estão na casa de US$ 117,5 milhões. O dirigente esclarece, no entanto, que algumas empresas serão muito prejudicadas, porque têm dependências maiores, na casa dos 50% a 60%, com ênfase nos móveis de madeira, com grande aceitação no mercado americano.

O que preocupa o setor como um todo é o efeito cascata das medidas, as quais devem reduzir a produção de outras atividades industriais, gerando uma possível redução de quadros. “O efeito direto será no consumo final. Desligadas, estas pessoas terão, naturalmente, mais dificuldades de compra, afetando toda a economia”, alerta.

A exemplo do Sindimadeira, a Movergs tem atuado junto a entidades, como a Abimóvel, representação nacional do setor, para que o governo busque canais de negociação. Pressão semelhante é feita junto ao Estado. 

“Esperamos que negociem e alcancem o consenso, as discussões paralelas não resolvem”, avalia. Não há, no momento, decisões sobre paralisação de atividades, mas Longhi não descarta a necessidade de férias para ajustes de produção.

A possibilidade de impactos das medidas na Fimma 2025, feira de máquinas e insumos que ocorrerá em agosto, em Bento Gonçalves, é descartada pelo dirigente. Destaca que o polo moveleiro não tem dependência de insumos e máquinas dos Estados Unidos, adquiridos essencialmente na Itália, Alemanha e China.

A atividade metalmecânica dos 17 municípios da região de abrangência do Simecs exportou, no ano passado, o equivalente a US$ 1,4 bilhão, sendo 23% para os Estados Unidos – algo próximo a US$ 262 milhões, 10% abaixo do ano anterior. Caxias do Sul, com US$ 129 milhões e Carlos Barbosa, com US$ 106 milhões, são os maiores exportadores, com destaque para a cutelaria, que alcançou US$ 57 milhões, mais de 22% do valor total.

Por segmento, o metalmecânico exportou US$ 160 milhões; ferramentarias, US$ 40 milhões; automotivo, US$ 30 milhões; acessórios metálicos de móveis e eletroeletrônicos, US$ 10 milhões cada. Por produtos, além da cutelaria, destacam-se pastilhas de freio e cilindros para guindastes, com casos de empresas exportando até 40% da produção para os Estados Unidos. Já as importações totais somaram, no ano passado, US$ 700 mil, com participação de apenas 3% dos Estados Unidos, equivalente a US$ 22 milhões.

O vice-presidente do Simecs, Rubens Bisi, argumenta que a tarifa de 10% anunciada em abril foi considerada administrável pelas empresas do setor. Já o índice de 50%, assim como o de 30%, é considerado inviável. “A situação é complicada e tende a piorar com o pedido de investigação pelos Estados Unidos com base na seção 301 e na recente manifestação da OTAN, questionando o governo brasileiro sobre as relações com a Rússia. Como a maioria dos países integrantes da organização são europeus podemos ter problemas por lá também”, alertou.

No entendimento do dirigente, o governo não está atuando adequadamente e tem dificuldades em abrir canais de negociação. “Os Estados Unidos sequer nomearam novo embaixador para o Brasil e os dois presidentes ainda não se falaram. O momento é de restabelecer as relações e reduzir o tensionamento, que é muito forte. O melhor a fazer é negociar, seguindo exemplo da China e de outros países. Mas é preciso reconhecer que não será nada fácil, até porque há uma afronta pessoal”, acrescenta.

Como forma de fazer frente aos impactos, empresas já iniciaram a redução de compras de insumos e programação de férias, considerando especialmente a dificuldade de redirecionar vendas para outros mercados. Segundo Bisi, a região tem presença marcante e ativa em vários países. “Os manufaturados têm uma situação diversa das commodities, que são de mais fácil recolocação. Os produtos vendidos para os Estados Unidos são, em sua maioria, homologados e específicos para atender as regras e o gosto do mercado local”, reforça.

Como preocupação complementar, Bisi cita a situação dos produtos embarcados, pois a carta do governo dos Estados Unidos não deixa claro qual data será considerada para efeitos de taxação. “Têm navios com mercadorias que só chegarão depois do dia 1º. Certamente, abrirá uma discussão jurídica junto à Organização Mundial do Comércio. Há uma dificuldade enorme de entender as medidas”, salienta. Na avaliação de Bisi, o esfriamento da economia que vinha sendo notado nas últimas semanas deve se tornar ainda maior ao longo dos próximos meses.

Fonte: Jornal do Comércio - Roberto Hunoff, de Caxias do Sul